Isolamento social impõe restrições e solidão a grávidas e mães que tiveram bebês durante a pandemia do coronavírus


Por causa do risco de contágio, essas mulheres precisam ficar longe de familiares e amigos. Grávidas e puérperas fazem parte do grupo de risco da Covid-19. Geise Oliveira fala sobre a solidão no momento da gravidez por causa do isolamento
Geise Oliveira/arquivo pessoal
A pandemia do coronavírus alterou a rotina e frustrou os sonhos de mulheres que estão grávidas e de outras tantas que acabaram de ter bebês.
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A necessidade de manter o isolamento social impõe a todas elas uma série de desafios, entre eles a solidão provocada pela distância física de parentes e amigos em um momento de profunda transformação na vida de uma mulher.
Essa é a maior dificuldade experimentada pela produtora cultural e pesquisadora Geise Oliveira, que está grávida de quase oito meses de um menino que se chamará Guilherme.
“Estou me sentindo solitária no sentido de não poder sair, não poder receber visitas, não poder sair para fazer o enxoval de Gui”, afirmou.
Monique Souza, que é advogada e microempresária, também sofre com a distância dos familiares.
A partir de meados de março, quando ela estava no quinto mês de gestação, a gravidez se tornou “virtual” até mesmo entre as pessoas mais próximas. Ela e Felipe Santana serão pais de gêmeas.
“Não vejo minha mãe há quase 2 meses, assim como minhas irmãs, que trabalham em hospitais e, querendo ou não, estão mais expostas. Somos muito próximas e isso me desestabiliza um pouco diariamente. Nós nos falamos por chamada de vídeo todos os dias, mas não é igual. Elas não puderam ver minha barriga crescer, sentir minhas filhas mexerem, acompanhar os exames de imagem”, afirmou.
Monique ganhou chá de fralda surpresa em Salvador
Arquivo pessoal
A solidão é só uma das consequências do isolamento experimentadas pelas futuras mamães. Sem poder sair de casa, exceto para realizar consultas e exames, outras atividades que são realizadas durante a gravidez, como o enxoval do bebê, foram descartadas.
Geise Oliveira conta que se sente frustrada por não poder comprar as roupas e montar o quarto de Guilherme do jeito que ela e Robson, o pai do bebê, sonharam.
“Isso tem sido o maior sentimento de tristeza, porque depois que caiu a ficha de que eu estava grávida, eu idealizei poder sair, comprar as coisinhas do quarto dele, poder fazer o chá de fraldas”, afirmou.
“Tanto a família por parte do pai de Gui quanto a minha família, todo mundo está muito perto. Mas tem uma coisa que era esse sonho, essa idealização desse momento, que a gente não está conseguindo vivenciar”.
Já Monique Souza revela que não pôde realizar o ensaio fotográfico que planejou para o período da gravidez, além de não fazer ideia de quando poderá apresentar as filhas para familiares e amigos.
“Não posso fazer um ensaio fotográfico como planejava. Não posso registrar o parto com fotos profissionais também, porque os hospitais, por segurança, obviamente, não permitem a entrada no centro cirúrgico de mais ninguém além do pai e da equipe médica. Não podemos ter visitas de amigos e familiares no hospital, pois estas são limitadas, e em casa também. Ou seja, sabe-se lá quando vão poder conhecer nossas filhas”, disse.
No último final de semana, Monique e Felipe receberam um verdadeiro presente dos amigos, que passaram de carro pela porta do condomínio onde moram para a comemoração de um chá de fraldas diferente.
O evento ganhou o nome de “charreata” e foi organizado pela sogra de Monique.
“A ‘charreata’ foi uma grata surpresa. Já estávamos conformados que não teríamos oportunidade de reunir os amigos para celebrar esse momento, então, ao vê-los ali, ainda que de longe e em seus carros, foi especial demais! Minha gravidez não parecia mais estar sendo virtual. Eles viram minha barriga, me viram. Chorei muito, mas de gratidão”, disse.
Amigos de Monique e Felipe fazem ‘charreata’ durante a pandemia
Grávidas e puérperas no grupo de risco
Mulheres grávidas e puérperas, que são aquelas que tiveram filho nos últimos 45 dias, passaram a integrar o grupo de risco da Covid-19 a partir do mês de abril.
Embora não haja estudos que comprovem que esses grupos sejam mais vulneráveis à doença, o Ministério da Saúde adotou a medida como forma de precaução, já que algumas puérperas morreram vítimas de coronavírus no país.
De acordo com o médico obstetra, José Carlos Gaspar, essa inclusão foi importante para preservar a saúde da futura mamãe e também do bebê.
“Isso é importante, porque a mulher grávida está em um momento da vida muito especial, então precisamos cuidar dela e do bebê que ela carrega na barriga. São dois pacientes que precisam de um cuidado mais rigoroso, até porque o cuidado da mãe reflete no cuidado do bebê”, afirmou.
“De fato, não há nada nesse momento que indique algum risco específico maior. Durante a gravidez, não há certeza de que o risco possa passar para o bebê, trazendo alguma alteração ou malformação. Também não há nada que mostre a transmissão vertical, que seria a transmissão do vírus no momento do parto”.
O médico obstetra alerta, entretanto, que grávidas que testaram positivo para a Covid-19 entraram em trabalho de parto de forma prematura.
“A única coisa que se tem referência é que algumas mulheres grávidas com a Covid-19 desenvolveram trabalho de parto prematuro. Mas isso não é uma especificidade da Covid-19. Qualquer inflamação, qualquer infecção durante a gravidez pode aumentar o risco de prematuridade”, afirmou.
Rebeca Rodrigues cuida de sua pequena Lis, que nasceu há menos de um mês
Rebeca Rodrigues/arquivo pessoal
A fotógrafa Rebeca Rodrigues, de 36 anos, deu à luz sua filha Liz no último dia 20 de abril. Além de ser puérpera, ela está no grupo de risco por ter apresentado um quadro de pré-eclâmpsia na gravidez, que tem como principais características a pressão arterial elevada, acompanhada de inchaço e de outros sintomas, como dor de cabeça.
Apesar de não ter sido infectada pelo coronavírus, Rebeca entrou em trabalho de parto de maneira prematura, o que acabou colocando a pequena Liz também no grupo de risco.
“Em relação à pandemia, tem um pouco mais de preocupação. Como ela nasceu prematura, a gente tem uma demanda maior de exames para fazer, então tem que ter muito cuidado na hora de sair”, afirmou Rebeca.
Sobre o quadro de pré-eclâmpsia, o obstetra José Carlos Gaspar afirma que essa condição, por si só, já torna a gravidez de alto risco.
“O que é pré-eclâmpsia? É a grávida que desenvolve hipertensão e, associada às vezes, ou não, a edema. Ora, nós sabemos que a hipertensão, por si só, agrava o risco da pessoa, se por ventura ela adquirir o coronavírus. Então, se nós temos uma grávida que vem cursando normal e faz o quadro de hipertensão e é contaminada, isso pode aumentar o risco dessa mulher”, disse.
Durante a gravidez, Rebeca Rodrigues chegou a cogitar a ideia de realizar um parto humanizado, dentro de casa. Entretanto, como precisou fazer uma cesárea, isso não foi possível.
A fotógrafa revela com tristeza que precisou enfrentar o parto sozinha, já que o marido não pôde acompanhá-la no momento.
“Meu esposo não pôde assistir ao parto. Eu fiquei muito triste. Eu só soube um pouco antes que não poderia ter isso no momento mais importante da vida da gente, ainda mais que também somos fotógrafos de parto. Eu tive que enfrentar sozinha”, afirmou.
Ela conta que chegou a ser cogitada uma internação na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) no momento do parto, mas, por precaução, a médica desistiu da ideia.
“Eu quase fui para a UTI, mas a minha média avaliou outros fatores. Eram dois pacientes com Covid-19 na UTI do hospital no período, então ela tomou a decisão de não ir”.
O medo de infecção pelo novo coronavírus nos hospitais é o principal motivo apontado por Geise Oliveira para considerar, assim como Rebeca, a ideia de realizar o parto em casa.
Na maternidade do Hospital Português, dois bebês morreram infectados pelo coronavírus, enquanto um terceiro que também testou positivo segue internado.
O hospital chegou a afastar 25 profissionais das funções, sendo que 14 já haviam testado positivo para a Covid-19.
Geise, que tem o parto previsto para julho, confessa que está estudando outras alternativas.
“É muito provável que, na hora do parto, apenas o pai possa estar presente. E olhe lá. Isso vai depender muito de onde vou fazer. Estamos pensando em procurar algumas alternativas de parto humanizado, tendo em vista o que tem acontecido, surto em maternidades. Então estamos procurando alternativas para não se expor aos riscos da Covid-19”, afirmou.
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By Negócio em Alta

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