Fiscalização é desafio para fazer valer um ‘lockdown’ na Grande São Luís, afirmam especialistas


Alguns apontam a dificuldade de controlar o trânsito de tantas pessoas na região. Outros reforçam a necessidade de mais preparo e planejamento do poder público. SÃO LUÍS (MA) – Rua Portugal, no Centro Histórico da capital maranhense. O local costuma receber centenas de turistas.
Rafaelle Fróes/G1 MA
Após a decisão judicial que obrigou o governo Flávio Dino a decretar um ‘lockdown’ (bloqueio total) em razão do aumento de casos e mortes pelo novo coronavírus, alguns pesquisadores se posicionaram sobre os desafios para fazer cumprir uma medida de restrição tão rigorosa.
Atualmente, o Maranhão é um dos estados piores contingentes de policiais militares e civis por habitante, assim como os municípios não possuem grande contingente de guardas municipais para realizar fiscalizações em massa.
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O G1 Maranhão conversou com especialistas, que deram sua opinião sobre o assunto e também ouviu prefeituras e governo sobre a realização, na prática, do ‘lockdown’ em uma região com mais de 1.4 milhão de habitantes, segundo estimativas do IBGE.
Estátua de São José de Ribamar
Reprodução/ TV Mirante
O governador Flávio Dino já afirmou que vai cumprir a decisão, que haverá aplicação de multas, e antecipou nesta sexta (1º) que haverá a implantação de barreiras na entrada e saída de São Luís e nas principais avenidas da cidade, com pontos de controle.
Porém, Dino ainda não deu detalhes sobre como será feita a fiscalização do tráfego de veículos e pessoas na Região Metropolitana. Segundo o governador, essas ações serão debatidas com sua equipe e divulgadas em um decreto no domingo (3).
De acordo com o assessor jurídico e membro da Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH), Antônio Pedrosa, a desigualdade social trabalha contra todas as medidas de isolamento e representa o maior desafio para conter a expansão da pandemia, assim como fazer valer um ‘lockdown’.
“Acredito que a mobilidade dos mais pobres é mais difícil fiscalizar, sendo de pouca eficácia as multas pecuniárias e até mesmo a prisão, sob pena de se criar mais problemas de infecção em cadeias já lotadas”
“O desafio maior é manter em casa quem não pode parar de trabalhar para sobreviver, visto que a ajuda dos governos não chega, ou representa um sacrifício muito grande, nas filas dos bancos. A decisão do juiz pode mitigar o problema nos bancos, mas estas pessoas vão demorar a ser assistidas e o desespero de morrer de fome dentro de casa daqui a pouco vai se instalar”, completa Pedrosa.
Pescadores entrando no mar no Porto da Salina, em Paço do Lumiar
Rafael Cardoso/G1 Maranhão
A especialista em gestão de pessoas e gestão de políticas públicas, Rosângela Guimarães, acredita que o controle da população vai demandar mais preparo e planejamento por parte do poder público.
“Os desafios de uma medida tão radical se mostram inicialmente pela dificuldade de controle da população, o que requer o preparo e distribuição de agentes públicos de saúde e segurança para a observância, fiscalização e e aplicação das sanções, além da gestão da resistência inúmeros conflitos pelo impacto inicial das ações, o que tende a normalizar e a produzir os resultados esperados”, explica Rosângela, que também é psicóloga, membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e Doutora em Saúde Coletiva pela UFRJ.
Para Cláudio Cabral Marques, promotor de Justiça Especializada do Controle Externo da Atividade Policial, é difícil prever a efetividade dessas medidas de restrição. Ele também afirma que é preciso lembrar das pessoas que não tem uma casa digna para viver durante esse período.
“No meu modo de entender, isso [lockdown] não vai funcionar porque nós temos casa para ficar confinados durante esses 10 dias. Mas eles esquecem das pessoas que moram na periferia, em barracos. Como essas pessoas vão ficar em lockdown? É cômodo falar em lockdown quando se tem casa espaçosa, internet… Não vai acontecer. Vai chegar uma hora que as pessoas não vão aguentar”
O promotor também diz que, com base nos recursos que o governo estadual possui, seria quase impossível realizar uma fiscalização de lockdown com eficiência.
“O contingente [policial] não vai segurar. Vai segurar em locais onde sempre houve controle, como na Litorânea, na Lagoa. Mas na periferia não vai ter como segurar isso”, afirma.
Viva Raposa
Reprodução/TV Mirante
Já para psicóloga Artenira Silva, o principal desafio em um ‘lockdown’ em São Luís será no uso adequado da força policial durante as fiscalizações na cidade.
“O maior desafio será de fazer a força policial entender que terão um papel/ função diferenciada: serão educadores em saúde, depois aplicarão multa é só depois conduzirão à delegacia”, diz Artenira, que também é pesquisadora em violência social e doméstica do mestrado de Direito e instituições do sistema de justiça da UFMA.
O que dizem as prefeituras
O prefeito de São Luís, Edivaldo Holanda Jr, disse ao G1 Maranhão que a prefeitura ainda não possui um plano de ação para fazer o lockdown acontecer, nem como serão feitas as fiscalizações das pessoas. O prefeito disse que ainda aguarda o decreto estadual para tomar as devidas medidas, que devem ser anunciadas na segunda (4).
A Prefeitura de Paço do Lumiar informou que vai cumprir o lockdown de serviços considerados não essenciais e que está montando um plano de ação para fiscalizar a movimentação de pessoas, de carros, e demais exigências da determinação judicial.
A assessoria de comunicação da Prefeitura de São José de Ribamar afirmou que o prefeito, junto com seus assessores, ainda está estudando a decisão judicial e a forma de cumprí-la. Disse ainda que até segunda todas as medidas estarão sendo tomadas.
Sobre as ações para cumprir a determinaçao de ‘lockdown’, a assessoria de comunicação da Prefeitura de Raposa não disse com detalhes como fará a fiscalização do trânsito de pessoas com recursos próprios.
A prefeitura de Raposa afirmou que atuará em ação conjunta com as policias militar e civil. Além disso, disse que manterá suas Unidades Básicas de Saúde (UBS) em pleno funcionamento e já começou as adaptações da Unidade Mista para, na segunda-feira (3), instalar uma área exclusiva de triagem 24h da Covid-19.
Coronavírus no MA
Segundo o último boletim epidemiológico divulgado pela Secretaria de Estado da Saúde (SES), o Maranhão atingiu a marca de 237 mortos e 4.040 infectados por Covid-19.
A taxa de ocupação dos leitos de UTIs para Covid-19 em São Luís, da rede estadual, é de 93,79%, enquanto a taxa dos leitos clínicos está em 69,80%. Na rede de saúde municipal, a ocupação dos leitos para a doença está no limite.
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