Contando 46 mortos e mais de 2.200 casos de coronavírus no Brasil, o presidente Jair Bolsonaro foi à TV e usou o espaço para dar um all in na tese de que a pandemia é uma histeria inflada pela mídia e que não há motivo para preocupação. “Devemos, sim, voltar à normalidade.”
A conta aqui é essencialmente política: Bolsonaro, de fato convencido que há exagero nos confinamentos e paralisação do país, tenta se distanciar dos impactos econômicos negativos. Na prática, busca poder dizer “eu avisei” lá na frente. Resta saber se no pós-crise o país vai dar valor ao hedge político do presidente.
A fala gera reações, torçamos para que uma delas não seja de mudanças ou restrições no trabalho do ministro Luiz Henrique Mandetta (Saúde), que tem sido voz sensata na crise. Constrangimento – certamente – trouxe.
Outro aspecto é uma relação esquisita, dúbia, com os governadores e com a crise em si: enquanto faz críticas, libera recursos para eles. Enquanto minimiza a crise, a equipe econômica prepara planos para combate dos efeitos econômicos.
Alguns dirão que, embora minimize a crise, Bolsonaro sabe que o estrago está feito e isso explica as atuações de Mandetta, Paulo Guedes, e outros tantos. Concordamos, pode ser essa a explicação. Mas, se Bolsonaro está disputando a liderança de uma tese, o risco que corre é de estar pregando para convertidos e financiando os que se opõem ao que prega. Os governadores que trabalharem direito sairão com mais força do que entraram nessa crise.
Um outro ponto é talvez um exercício que a quarentena e a criatividade que dela advém nos fez notar. Reparem que o discurso de Bolsonaro se assemelha muito ao de Trump, só que com um dia de atraso – e sem considerar as abissais diferenças entre Estados Unidos e Brasil. Assim foi em pelo menos dois casos: no de ontem (24), quando Bolsonaro fala dos efeitos do lockdown, e também no imbróglio com a China. Ok, nesse caso com a China não foi Bolsonaro diretamente, esse cuidado foi tomado. Assim como foi tomado também o cuidado para que fosse alguém com o sobrenome Bolsonaro. Xi Jinping não fica sem atender Donald Trump ao telefone, mas recusou a primeira ligação de Bolsonaro e só o atendeu ontem, segundo relatos na imprensa. Perigoso copiar Trump.
Realmente temos nos questionado como a população tratará os que tem feito política com a crise. No caso de Bolsonaro, o que aparenta é que ele outra vez – já fez várias vezes no passado – se encastelou na sua base mais dura e, espécie de Lula de azul, fala neste momento para os seus. Nas redes sociais, há movimento que tem de ser acompanhado de perto: Bolsonaro e sua militância já não pautam sozinhos, já não são maioria, apesar de enormes.
Futurologia: Bolsonaro falou ontem. Por ora, e a não ser que ele triplique a aposta e mude ações concretas de governo – o que seria um problema –, a vida vai seguir. O Congresso negociará com a equipe econômica os pacotes a serem aprovados e os aprovará, buscando trabalhar em direção e discurso contrários ao de Bolsonaro, em tentativa de o expor.
O problema: como consequência da linha de ação que o presidente adota, no meio político fala-se, pensa-se, discute-se, especula-se muito mais do que se deveria, a economia suporta, e a crise permite, formas de governo e supostas intenções não democráticas. Também ouvimos discussões sobre longevidade de mandatos.
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