As medidas anunciadas pelo Banco Central, que já passam de R$ 1 trilhão, para dar suporte aos bancos em meio à pandemia de coronavírus não resolvem o principal problema desta crise: o aumento do risco. Ao irrigar o sistema com recursos, na expectativa de que as instituições abram suas torneiras de crédito – seja por meio de linhas tradicionais ou para garantir folhas de pagamentos -, o BC pode, na opinião de especialistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast, repetir os erros de 2008. À época, a liquidez dos bancos ficou “empoçada” (quando o dinheiro fica parado nas tesourarias das instituições) e somente Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil atuaram na linha de frente, enquanto seus pares privados se retraíram.
A demanda por crédito nos bancos disparou com a chegada do novo coronavírus no Brasil e o fechamento do mercado de capitais. Grandes empresas de diversos setores, como varejistas, montadoras e indústrias correram aos bancos para acionar linhas disponíveis. Ainda que não precisem delas neste momento, para reforçar o caixa, elas preveem dias mais difíceis e precisam ter recursos disponíveis à vista. O salto nos pedidos encareceu a obtenção de financiamento. Mesmo pagando mais caro pelos recursos, algumas empresas já encontram as portas fechadas, principalmente em instituições privadas, que naturalmente recuam diante do aumento do risco na economia.
Ao mesmo tempo, as pessoas físicas e as pequenas e médias empresas – até outro dia, o motor para o crédito no Brasil – podem ficar sem recursos para enfrentar os estragos deixados pelo novo coronavírus. A ameaça do desemprego e o comprometimento de caixa minam o apetite dos bancos, deixando esse público – que está no centro da crise – desamparado no momento em que mais precisa de novos recursos.
“O problema é fazer os recursos chegarem às pequenas e médias empresas, às pessoas de menor renda. Para isso, as políticas anunciadas são ineficazes e primárias. A questão do crédito está mal endereçada”, diz um experiente especialista do setor bancário, na condição de anonimato. “O remédio não é crédito. É seguro e ajuda, tudo o que o governo Bolsonaro não quer, mas terá de fazer.”
Neste contexto, medidas adicionais foram apresentadas pelos bancos à equipe econômica, incluindo empréstimos para subsidiar folhas de pagamentos e ainda a criação de um fundo – como outros que estão em estudo por conta da crise – com recursos públicos e privados. A ideia é que esse colchão de dinheiro dê suporte a empresas e indivíduos neste momento. O desafio, na visão de fontes do setor, é a coordenação que essas estruturas vão exigir.
Folha de pagamentos
No caso dos empréstimos para garantir folha de pagamento, diz a fonte, a alternativa em discussão é subsidiá-los, com taxas de juros baixas e carência de três a seis meses. Para evitar que o crédito seja concedido sem critério, a sugestão é montar um sindicato de bancos ou uma empresa de capital misto. Ou seja: combinar atores públicos e privados, o que garantiria as operações e a oferta de recursos com disciplina.
“Ou isso ocorre ou os bancos públicos terão de entrar sozinhos novamente”, afirma a fonte. “Não basta dar liquidez para o sistema: é preciso segurança e conforto para que os bancos emprestem.”
Os bancos públicos foram os primeiros a divulgar medidas para enfrentar a crise. Enquanto o BB anunciou R$ 100 bilhões, a Caixa liberou R$ 75 bilhões e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) outros R$ 55 bilhões. Além disso, tantos os públicos quanto os privados estão flexibilizando os pagamentos de pessoas físicas e jurídicas por 60 dias.
Questionado sobre o risco de os bancos “sentarem em cima” dos recursos em vez de emprestá-los, o presidente do Banco Central, Roberto Campos, negou que haja sinais no cenário atual, mas prometeu monitorar a postura das instituições. “Vamos tentar direcionar para pequenas e médias empresas, ou destinar para setores específicos. Os bancos têm um grande potencial em mãos e vamos monitorar isso”, disse na segunda-feira em coletiva de imprensa.
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