SÃO PAULO – A crise econômica global deflagrada pela pandemia de coronavírus pode ser tão forte ou mais que o grande crash de 2008, na opinião de diversos analistas. Contudo, há diferenças fundamentais entre os dois casos e os prognósticos não são nada animadores para o futuro da atividade econômica brasileira.
Segundo analistas do Credit Suisse, o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil deve demorar para voltar aos níveis do primeiro trimestre de 2014, antes da grande recessão dos anos 2014-16. Avaliando a média e a mediana das recuperações econômicas depois de todas as contrações do PIB desde 1980, Leonardo Fonseca e Lucas Vilela fizeram simulações que apontam para uma forte retração da economia brasileira em 2020, não importando o ritmo do crescimento posterior à pandemia de coronavírus.
Este cenário é um reflexo da primeira diferença entre o Brasil de 2020 e o da crise de 2008, destaca a equipe de análise do banco suíço. Na crise do subprime, a economia chinesa não teve mais do que uma contração moderada, enquanto os efeitos da crise atual são muito mais fortes, uma vez que a maior economia da Ásia teve períodos de quarentena total em diversas regiões.
A segunda diferença entre as duas crises é que, enquanto o impacto do crash de 2008 se disseminou simultaneamente no mundo todo, a pandemia da Covid-19 vai impactar os países de modo que cada um tenha um pico de casos da doença, um momento de isolamento total da população e um ápice na paralisação da atividade econômica diferente do outro.
Por fim, a terceira e talvez mais importante diferença é que enquanto o choque de 2008 se concentrou nos setores financeiro e imobiliário, a crise atual afeta todos os segmentos não financeiros da economia global. “Na grande crise de 2008, os bancos centrais tiveram um papel fundamental em manter a solvência dos bancos privados para minimizar os efeitos nos demais setores. No momento atual, a ampla paralisação tem um impacto direto na economia real e dependendo da intensidade deste impacto nos balanços de empresas e famílias pode ameaçar a solvência de todo o sistema financeiro”, preveem os analistas.
Na prática, isso significa que as medidas de relaxamento monetário aplicadas pelos bancos centrais em 2008 seriam menos eficazes agora, pois os setores mais afetados como turismo, comércio e indústria são menos afetados por reduções nas taxas de juros e injeção de liquidez no setor financeiro do que os bancos que quase quebraram 12 anos atrás.
Especificamente no Brasil, há ainda uma quarta diferença apontada pelo Credit Suisse. Em 2008, o Tesouro Nacional tinha formado um caixa robusto por meio da aplicação por muitos anos do tripé macroeconômico: superávit fiscal, metas de inflação e câmbio flutuante. Com destaque para o primeiro dos pilares deste tripé, o superávit nas contas públicas, que permitiu ao governo Lula implementar uma forte resposta anticíclica.
O superávit primário caiu de 3% do PIB nos tempos pré-crise para zero em 2009. Ao mesmo tempo, a taxa de juros mais alta dava mais espaço para estímulos monetários e o Banco Central conseguiu cortar a Selic em 5 pontos percentuais para enfrentar os efeitos da crise. Fora isso, o crédito foi ampliado com muitos empréstimos dos bancos públicos.
Hoje em dia, não é preciso nem falar que a situação é outra. O País vem de uma sequência de déficits fiscais anuais e para implementar pacotes de estímulo fiscal o governo vai precisar gerar muita credibilidade diante dos investidores internacionais acerca do ajuste fiscal no médio e logo prazo.
“Uma necessária, mas não suficiente condição para a eficácia das medidas fiscais é a manutenção dos controles atuais como Regra de Ouro e Teto de Gastos, o que mostraria que o aumento nos gastos será apenas temporário”, explica a equipe do banco suíço.
Do lado monetário, a taxa de juros baixa, em 3,75%, limita muito o espectro de atuação do BC, que se for muito ousado no relaxamento da política monetária, pode causar uma fuga no capital estrangeiro, que vai buscar por maior rentabilidade em outros países, o que pressionaria ainda mais a taxa de câmbio.
Portanto, a crise atual é mais desafiadora e o mundo, particularmente o Brasil, tem menos instrumentos para enfrentá-la do que tinha em 2008. Uma recessão é amplamente esperada e o futuro é bastante incerto, avaliam os economistas do banco.
Vale ressaltar que, na última sexta-feira, diversos bancos revisaram o PIB do Brasil para baixo, destacando que o lockdown durará mais tempo que o inicialmente esperado e até destacando possíveis riscos políticos. O JPMorgan passou de expectativa de contração de 1% para queda de 3,2%, o Morgan Stanley deixou a estimativa cortou de alta de 0,3% para baixa de 3,7%, enquanto o Goldman Sachs passou de baixa de 0,9% para queda de 3,4%. O Citi, relativamente menos pessimista, passou de projeção de expansão de 2,2% para queda de 1,7%, mas vê chances de novas revisões para baixo.
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