SÃO PAULO – A crise provocada pelo avanço do novo coronavírus e a necessidade de medidas de resposta à pandemia da doença alteraram de forma relevante a agenda legislativa e esfriaram o timing para o avanço de reformas econômicas antes já consideradas complexas e desafiadoras.
Na avaliação de analistas políticos, a janela de oportunidade diminuiu sensivelmente nos últimos dias. É o que mostra a edição de março do Barômetro do Poder, iniciativa do InfoMoney que compila as avaliações e projeções das principais consultorias de análise de risco e analistas independentes em atividade no Brasil. Para acessar na íntegra, clique aqui.
O levantamento, realizado entre 16 e 19 de março, revela que as apostas de que o governo consiga cumprir a agenda de reformas planejada para este ano caíram significativamente, seja com a postergação do calendário, seja pela percepção de maiores dificuldades no andamento dos temas até o fim do mandato do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), em 2022.
A pauta contempla as três PECs (Propostas de Emenda à Constituição) do chamado pacote Mais Brasil. São elas, a PEC Emergencial, a PEC dos Fundos e a PEC do Pacto Federativo, todas em tramitação no Senado Federal.
Nos três casos, houve piora nas perspectivas de aprovação. Para os analistas políticos, as chances de avanço são ainda menores no caso do Pacto Federativo, enquanto a PEC dos Fundos é a que mais alimenta posições antagônicas. A PEC dos Fundos é a única em que as avaliações de chances altas (23%) superam as baixas (16%).
“A emergência do coranavírus e o apoio do presidente às marchas contra o Congresso [em 15 de março] vão reduzir ainda mais a margem para votações importantes”, pontua um dos respondentes.
A mesma piora se reflete no calendário, com os analistas adiando as perspectivas para votação dos temas. Em todos os casos, exceto a PEC dos Fundos, as apostas majoritárias são de que os debates se arrastem para 2021, diante da sobreposição da pauta urgente de combate à Covid-19.
“A janela legislativa de 2020 já era curta, mas foi comprimida pela crise da Covid-19, que restringirá os trabalhos legislativos no primeiro semestre – não apenas em Plenário, mas também as discussões em comissões”, observa outro analista que participou do levantamento.
“O momento de crise tira de foco a questão das reformas. As ações do ministro Guedes de tentar colocar as reformas em pauta e de membros da sua equipe – Secretaria de Política Econômica – na mesma direção foram rejeitadas por largos setores da sociedade e do mundo político”, afirma mais um analista.
Também estavam no radar antes da crise do novo coronavírus medidas como a reforma tributária, em discussão em uma comissão mista instalada pelo Congresso Nacional, e a reforma administrativa, com encaminhamento prometido pelo governo desde novembro. As perspectivas nestes dois também são negativas.
No caso da reforma tributária, o novo coronavírus agora é considerado o principal obstáculo para o avanço da discussão, na avaliação de 54% dos analistas consultados. Na sequência aparecem a ambiguidade, indefinição e problemas de articulação política do governo (31%) e a resistência de setores específicos da economia (15%).
“Paulo Guedes promete a apresentação da reforma tributaria desde 30 de maio de 2019. Nunca apresentou. Paulo Guedes prometeu o envio da proposta de reforma administrativa ao Congresso no início de novembro de 2019, prometendo, inclusive, sua aprovação pela Câmara até o Natal. A Câmara não aprovou, claro, porque Paulo Guedes não enviou uma proposta. Tirando o que estava herdado de Temer (Reforma da Previdância e leilão do pré-sal), Paulo Guedes apenas produziu bravatas (R$ 1 trilhão em privatizações, R$ 1 trilhão em imóveis da União, zeragem do déficit primário de 2019, crescimento de 2% ou mais…). Era um time fraco e desordenado antes do impacto do COVID-19 na economia. Agora isso tudo fica escancarado”, critica um dos analistas.
Para a maior parte dos analistas políticos consultados (85%), deputados e senadores devem deixar a agenda de reformas de lado em um primeiro momento, focando na discussão e aprovação de respostas emergenciais à crise provocada pelo novo coronavírus. Apenas 15% acreditam na possibilidade de conciliação das agendas.
Em meio à crise, analistas também viram aumentar a probabilidade de a regra do teto de gastos, aprovada há pouco mais de três anos, ser flexibilizada durante o mandato do presidente Jair Bolsonaro.
O levantamento mostra que o grupo dos que consideram alta ou muito alta a chance de isso acontecer saltou de 38% para 69% entre novembro e março. Já as avaliações negativas mantiveram 23% dos respondentes, enquanto as regulares despencaram 30 pontos percentuais, para 8%.
A leitura predominante é que, diante das novas dificuldades impostas, o Legislativo deve se voltar exclusivamente para medidas urgentes, tanto do ponto de vista sanitário quanto econômico. As preocupações vão desde o atendimento aos infectados e o acesso a insumos de saúde até o socorro a empresas e a manutenção de empregos.
A 14ª edição do Barômetro do Poder contou com a participação de nove casas de análise de risco político: BMJ Consultores, Control Risks, Dharma Political Risk and Strategy, Medley Global Advisors, Patri Políticas Públicas, Prospectiva Consultoria, Pulso Público, Tendências Consultoria e XP Política. E quatro analistas independentes: Antonio Lavareda (Ipespe); os professores Carlos Melo (Insper) e Cláudio Couto (EAESP/FGV) e o jornalista e consultor político Thomas Traumann.
Conforme acordado com os participantes, os questionários são aplicados por meio eletrônico e os resultados são divulgados de forma agregada, sendo mantidas sob anonimato as respostas individuais.
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